segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Manual do Miguxo I: Meritocracia e igualdade

A imagem pode ser encontrada na página Meu Professor de História

Já faz um tempo que eu venho procrastinando a publicação de algum artigo original por aqui. Como uma das minhas principais área de interesse é a economia, achei que seria de bom tom retornar falando de algo que eu, modéstia à parte, entendo razoavelmente bem. No caso, falemos do post acima. Claramente uma crítica à praticidade da Meritocracia num ambiente de Livre Mercado.

O principal equívoco identificável é a confusão implícita do significado e das implicações da meritocracia num ambiente de economia de mercado. A primeira coisa que deve ficar CLARA à quem debate numa discussão com socialistas é que a igualdade econômica simplesmente não está no Menu. Meritocracia não é promessa de igualdade. Meritocracia é promessa de retribuição a quem é eficiente. Acontece que na economia de mercado, eficiência é sinônimo de oferecer um produtor de melhor qualidade e a menor preço possível: Ou seja, o capitalismo não duraria um dia se a sua lógica "de sistema" fosse o empobrecimento dos trabalhadores e não o contrário.

Ademais, o poder de compra dos trabalhadores precisa aumentar, sempre que a produtividade "per capita" de um sistema produtivo aumenta, e por uma razão bem simples. Se a produtividade aumenta, mas o consumo não aumenta, ao menos à longo prazo, numa medida igual ou parecida, haverá super-produção e estocagem e a produção é obrigada a voltar ao patamar inicial. O governo pode resolver isso inicialmente imprimindo dinheiro e comprando o excedente, mas isso vai gerar inflação o que em longo prazo destrói a economia.

Há formula mágica. Todo ser humano é consumidor e produtor, em diferentes graus e de diferentes formas, posto que coordenam a produção física e coordenam a partir de escolhas pessoais a fixação dos valores desses artigos físicos (ou dos serviços prestados, que são "mercadorias não-físicas", na falta de termo melhor).

E como é que esse processo ocorre? A partir do emprego de capital, que não se reduz a dinheiro obviamente mas inclui também ao capital intelectual e social do indivíduo que empreende. E empreender significa o que? Significa buscar atender à alguma demanda que se crê, exista na sociedade, e desse atendimento, extrair lucro. Quais são as consequências desse atendimento? Eu gero valor em capital, posto que dediquei capital cultural, intelectual e monetário à uma produção que visa excedente financeiro.

E para onde vai o valor gerado? Eu gasto esse valor na compra de artigos produzidos por outros indivíduos com igualmente visavam produzir algo, atendendo certa demanda (no caso, a minha dentre outras).

E claro, caso eu atenda a demanda muito bem, eu posso contratar outra pessoa para me ajudar, oferecendo-lhe parte do valor produzido, não por ela apenas, mas por todo o capital (cultural, social, monetário, físico, etc) despendido na produção daquele valor. Essa mão de obra vendida a mim, obedece à mesma regra, é um sujeito com um capital específico (a mão de obra de qualquer natureza) que pretende atender uma demanda minha, em vista do seu lucro (que no final do dia, ele tenha mais dinheiro do que teria se ficasse em casa sem fazer nada).

Eu poderia prosseguir, mas o essencial creio que já está claro: NUNCA é um jogo de soma zero. Um rico não é rico empobrecendo outro, a menos que lhe roube, o que NÃO é o caso do trabalho assalariado.

Consideradas essas coisas, é importantíssimo frisar que essa esquematização trata do mérito apenas tento como fim o sucesso econômico e que esse sucesso econômico quando não esbarra numa barreira ética (caso do "mercado" do aborto legal, por exemplo), tende a proporcionar à sociedade uma prosperidade em sintonia com o sentido cristão de bem comum, ainda que ocasionalmente uma sociedade com cultura cristã já arrefecida possa lançar-se sobre outros valores, bastante questionável, a razão é primordialmente moral do que econômica.

Em suma, o mercado quando livre não permite que EU, ou VOCÊ, ditemos o que quer que julguemos mais adequado ao consumo mas dá as pessoas a liberdade e a responsabilidade para essa decisão individual e coletiva à um só tempo, visto que trata-se primariamente uma questão de eficiência em atender uma demanda do maior número possível de pessoas.



Essa eficiência possui um aspecto quantitativo e um qualitativo. Em outras palavras, a eficiência precisa atender um número grande de pessoas, ou precisa atender uma demanda tão valorizada que o indivíduo possa dedicar tempo a uma só e estipular uma margem de lucro que compense seu tempo investido naquela única atividade. A galinha dos ovos de ouro é quando o sujeito encontra uma demanda que seja ao mesmo tempo quantitativa e qualitativamente eficiente (um produto com alta margem de lucro e que muitos querem), mas a regra são profissões que se situem num campo centralizado entre essas duas variáveis. 

Tomemos um exemplo que muito incomoda e emudece vários defensores da liberdade de mercado: Por que é que o ator da Globo ganha muito mais do que um médico? Onde está a meritocracia aí?

Como eu disse, a eficiência na meritocracia econômica não tem nada a ver com o que EU, ou VOCÊ, achamos justo. Mas o que as pessoas, em geral, buscam ou querem (ou demandam, pra usar um termo que venho usando até agora). Se por um lado, as pessoas vão buscar coisas que nem sempre achamos que é o melhor para elas (e eu concordo plenamente com quem dizer que certas coisas são super-valorizadas e outras, infelizmente, sub-valorizadas), por outro esse sistema possui o mérito de ser naturalmente democrático, de não dar a nenhuma pessoa individual o poder e o direito de decidir quem ela acredita que seja mais ou menos importante ou merecedor.

No caso, como a economia de Mercado explica o ator global e o médico? Eficiência quantitativa. O ator atende à demanda de quem? Seus telespectadores. Aposto que se você dividir o salário diário do ator, pelo número de espectadores, verá que ele ganha bem pouco por cada um. Certamente bem menos do que o médico ganha por paciente. A questão é que o ator atende, em uma hora diária de novela, milhares e talvez milhões de pessoas ao mesmo tempo. Ao passo que o médico só pode atender um punhado delas no mesmo período.

Quanto a isso, não há o que possa ser feito. É da própria natureza das profissões. Um médico não pode atender pacientes na quantidade de telespectadores de uma novela global e não há por que a Globo limitar o número de telespectadores das suas novelas. Não se trata de merecimento, mas de pura escolha individual de cada uma das pessoas e mexer com isso é mexer em nada menos do que o direito de escolha dos cidadãos. 

Um comentário:

  1. Fantástico Italo. Explicou com frases simples coisas que alguns denotam livros inteiros para explicar.

    Quanto ao meme, penso que ele pende muito ao distributismo se olhado com cuidado.

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